O Natal está na Pediatria
On 20 Dezembro, 2018 2018 | Do lado de cá Comentários fechados em O Natal está na Pediatria No tagsEntramos na sala das Educadoras, no mesmo momento em que se reúnem as equipas de animação que minutos depois darão mais cor aos corredores da Pediatria de Santa Maria.
Estamos ali porque queremos assistir a algumas das muitas iniciativas lúdicas que o Hospital de Santa Maria tem para entreter as crianças internadas. Grupos de animação que se vestem com fatos de fantasia, equipas que brincam com marionetas e contam contos de encantar, outros que tocam e cantam, ou teatros com relatos de magia. Todos circulam pelos andares da Pediatria do Hospital para roubar sorrisos envergonhados de crianças que esperam por melhoras e distrair pais cansados e preocupados. Na retaguarda de tudo isto estão as Educadoras que se articulam com as equipas de cada piso da Pediatria, para que esteja tudo a postos para os momentos de surpresa.
Não sabemos o que se passa com a história de vida de cada um dos meninos que encontramos e na verdade a nossa defesa é essa, não apurar o caso clínico da Leonor, ou da Elaine, do Joaquim, do Simão, ou da Vitória, queremos apenas fazer saltar um abraço, ou um sorriso, em troca de um olhar curioso. A maior parte destes meninos está diante de internamentos, alguns longos, com processos complicados e silenciosos. Podem vir a passar o Natal no Hospital e precisam de acreditar nas histórias de encantar.
A Associação Harpa – Associação Recriar Para Aprender – de natureza pedagógica e sociocultural, reconhecida pelo Ministério da Educação, foi fundada em 1999, por um grupo de professores. Composta por 4 mulheres, encontramos a Elsa, a Gisela, a Adelina e a Mila. Um grupo de Marionetistas: “Ao som da harpa” que vêm contar a história da “Menina da lanterna”. Todo o cenário é construído por peças naturais: os bonecos são de lã e a floresta tem folhas e galhos de madeira verdadeiros. Os bonecos deste conto não têm rosto para que cada criança imagine a sua expressão e o nome que lhe quiser dar.
A sala vai enchendo e ficando atenta ao teatro já previamente ensaiado e preparado zelosamente. Arrumam-se as cadeiras de rodas e pegam-se ao colo nos mais pequenos com dificuldade em ir pelo seu pé. As Educadoras também estão e são rostos familiares nossos, são sempre como uma extensão da família, zelosas do conforto e dos afetos dos pequenos e que aos pais escasseia, por vezes, numa tristeza mal disfarçada. Num fragmento de poucos minutos os pequenos envolvem-se na magia da história e esquecem as cicatrizes, as mazelas que não se veem, mas doem. Estamos todos na sala de estar que podia ser a nossa de casa, há pantufas e roupões e um calor que é acalentado entre todos. Mais do que o sentido do conto é o toque que nos impressiona, no cuidado e na delicadeza do grupo “Ao som da Harpa” que faz deslizar os fantoches no rosto e nos dedos de alguns que não falam sequer.
Passam por nós figuras de fantasia que tínhamos ridiculamente esquecido. O Pai Natal que se chama Tiago Couto, a Branca de Neve Madalena Venâncio e a Rapunzel Beatriz Teixeira. Os três pertencem à “Sem Tábuas”, uma Associação Socio Cultural e Artística, que faz produções culturais independentes, assim como utiliza a arte como um fim de coesão social, integrando várias ações de solidariedade. Empáticos e de sorriso natural arrancam pelos corredores, subindo e descendo pisos, enquanto enchem balões de flores e espadas. Desenham magia e princesas no rosto das meninas e dizem todos os nomes das crianças internadas, cantam para elas e encantam mães que, por segundos, passam de cuidadoras a desprotegidas.
Os corredores e as salas estão decoradas ao pormenor, o Natal não se esqueceu um minuto de passar por cá, enfermeiras e auxiliares usam elementos alusivos à época e alguns médicos estendem os braços de alegria por rever agora adultos dos grupos recreativos e que em tempos foram os seus meninos de consulta.
Depois de termos percorrido todos os quartos de cada piso, depois de termos passado pelas alas mais delicadas, volto atrás a um dos quartos onde já voltara o silêncio e então reparo que a Constança continuava a olhar para a flor que lhe tinha sido dada. E continuava a sorrir sozinha. Então valeu tudo a pena.
Passar o Natal no Hospital nunca é um cenário que desejamos a ninguém, mas se assim tiver que ser que seja rodeado por estas equipas multidisciplinares e tão empenhadas.
Às Educadoras, enfermeiros (as), auxiliares, médicos (as) e Associações, mas sobretudo às crianças e às suas famílias, um Feliz Natal!
Joana Sousa
Equipa Editorial
Reportagem Fotográfica: Isabel Varela